Obra / Arquitetura

Fundação Oscar NiemeyerFundação Oscar Niemeyer
CENTRO ADMINISTRATIVO DE PERNAMBUCO
Ano: 1980
Local: Recife
País: Brasil
Descrição:

"Ao iniciarmos este projeto procuramos, em primeiro lugar, estudar o local escolhido para os três palácios que representam o Centro Administrativo. 

E, como já tínhamos calculado suas áreas úteis, sentimos que o espaço oferecido não permitiria uma solução generosa, como se impunha, à expansão inevitável.
E examinamos com a maior atenção, a região proposta para todo o conjunto, verificando que ela se destinava exclusivamente ao Centro Administrativo, sugerindo portanto um traçado viário próprio e definido, sem compromissos com o plano rodoviário estadual, sem cortar o terreno desnecessariamente, sem criar movimentos de terra onerosos nem dificultar - o que era fundamental - as ligações entre os diversos setores do Centro Administrativo.
E resolvemos propor uma solução radical, que constituisse uma contribuição efetiva, justificando assim nossa colaboração.
Os acessos existentes para o local escolhido são feitos pela A-II - Avenida Beira-Rio e pela Linha Férrea, Tronco Norte da RFFSA. Centralizar esses acessos nos pareceu a preliminar indispensável. 
Para isso criamos na entrada do Centro Administrativo um grande estacionamento e, próximo ao mesmo, uma estação para a estrada de ferro. Dessa estação parte o "monorail" projetado, levando para o Centro Administrativo os passageiros da ferrovia e, mais adiante, os que deixaram seus carros no estacionamento.
É um esplêndido passeio, suspenso sobre a paisagem: primeiro, surge a praça cívica, com seus espelhos d'água e sua arquitetura feita de curvas e grandes espaços livres; depois, a zona cultural com suas formas harmoniosas e a seguir a linha austera dos blocos das secretarias e os prédios anexos, com eles contrastando plasticamente.
Sob o "monorail" fica a avenida de pedestres, a espinha dorsal do conjunto. Nela circulam os que, deixando o carro no estacionamento, preferem seguir a pé pela avenida que conduz ao Centro Cívico, vendo a arquitetura do Centro Administrativo a surgir pouco a pouco, numa escala mais verdadeira, e nela penetrando interessados.
Por baixo da avenida de pedestres passam apenas os veículos dos que trabalham no Centro Administrativo ou os que para isso possuem a devida autorização. É uma estrada, subterrânea, que varia de nível em função da conformação natural do terreno, e que, após os blocos das secretarias, continua a céu aberto até os prédios anexos.
Como a idéia do "monorail" sempre desperta dúvidas - técnicas e econômicas - previmos a possibilidade de deixar essa solução para uma etapa posterior, usando, provisoriamente, dentro do esquema viário fixado, uma linha de micro-ônibus para a ligação da estação rodoviária com o Centro Administrativo. É uma alternativa que apresentamos a contragosto, principalmente agora que o "monorail" já tem protótipo em teste no Rio Grande do Sul. Como seria bonito o passeio pelo 'monorail'! Que idéia de progresso técnico não daria a utilização desse sistema tão simples e lógico, ainda desconhecido em nosso país!
Na Praça Cívica ficam os palácios: do Governador, da Justiça e da Assembléia Legislativa, e sob ela, aproveitando as curvas de nível existentes, o estacionamento de veículos que serve aos três edifícios. É o princípio de não alterar as inclinações naturais do terreno que procuramos manter, dentro do possível, em todo o projeto, criando sob a praça o enorme estacionamento, fixando para os demais edifícios do conjunto um gabarito de altura definido de modo que eles se adaptem ao terreno, variando, se necessário, o número de pavimentos.
A arquitetura dos palácios guarda o denominador de unidade desejado: o mesmo espírito arquitetônico e os grandes vãos livres que o concreto nos oferece generoso. Quem não se entusiasma ao ver a antiqüíssima cúpula de Roma, com 42 metros de vão? E não é a arquitetura da cúpula que desperta esse entusiasmo, mas imaginar como foi possível fazê-la em época tão distante, com a técnica ainda limitada e incipiente!
Na verdade repetimos apenas a lição do passado, dos grandes exemplos da arquitetura.
Diante do Palácio do Governador é o vão espetacular que domina, a viga virandeil a sustentar os pré-fabricados das lajes de pisos; o pilotis alto - 8 metros! - e sob ele dando-lhe pelo contraste maior realce, a tribuna e as rampas de acesso. Ladeiam o Palácio do Governador a Assembléia Legislativa e o Palácio da Justiça, circulares como seus programas exigem. Ambos, de funcionamento complexo; o da Assembléia principalmente tão cheio de minúcias funcionais que para bem elabora-lo redigimos, preliminarmente, este pequeno texto:
 
'O mais importante no projeto de uma Assembléia Legislativa é a ligação correta entre seus diversos setores e uma flexibilidade interna que permita qualquer modificação futura. No Congresso Nacional, a falta de um programa, a urgência da obra, etc., dificultaram as modificações surgidas. Algumas, motivadas por alterações no próprio sistema - parlamentarismo, etc. - outras, pelas incompreensões inevitáveis. Felizmente, prevaleceu quase sempre, a necessária receptividade e o Congresso Nacional foi recuperado e construídos os prédios anexos que compreendem, como os escritórios particulares dos deputados, opções posteriores.
O problema de uma Assembléia Legislativa se resume, principalmente, na boa circulação interna que tem como base o plenário. Com ele devem estar ligados todos  os setores da Assembléia, desde a direção geral: Presidência, vice-Presidência, secretários, líderes, diretor geral, imprensa, bar, etc., até os serviços complementares, como os setores jurídicos, técnicos e administrativos. No plenário devem estar integrados o recinto do público, as cabines de imprensa, rádio e tradução simultânea, inclusive os serviços de taquigrafia, datilografia, etc. E como as distâncias devem ser curtas, a arquitetura caminha, naturalmente, para uma forma circular em cujo centro fica o plenário, ponto de convergência de todo o conjunto.
O projeto deve ter suas áreas generosamente fixadas, visando a modificações futuras, os escritórios particulares dos deputados construídos em bloco separado, diretamente ligado ao plenário e um bloco para futuras ampliações do setor administrativo.
Quanto às entradas, devem ser independentes para os deputados, público e funcionários e servidas dos respectivos estacionamentos. 
A estrutura deve evitar colunas internas e marcar com amplos espaços livres a importância da obra.
E a arquitetura sóbria e correta, como convém a uma Assembléia Legislativa.'
Foi baseado neste estudo que projetamos a Assembléia Legislativa de Pernambuco, e a solução adotada nos parece tão clara e funcional, elástica e expansível, que de outra forma não mais a poderíamos conceber.
Quanto ao Palácio da Justiça as mesmas razões de bom funcionamento nos serviram de guia, pois se trata de uma obra que exige, como a Assembléia Legislativa, um esquema de circulação exato e total flexibilidade interna. A solução circular que propomos visa igualmente reduzir as distâncias, criando para o público largas rampas, galerias de 5 metros de largura, etc. Dentro da forma circular adotada se distribuem os diversos setores. O da Presidência e dos desembargadores ligados à sala do Pleno e o das varas criminais ao salão de julgamento, com capacidade para 300 pessoas, sala secreta, acessos independentes para os jurados e os próprios acusados.
O restaurante está localizado nos pilotis, que fica livre, entregue ao público, como uma grande praça coberta. Nas fachadas, como na Assembléia e no Palácio do Governador, são as grandes superfícies de vidro, protegidas quando necessário, e na cobertura uma placa de concreto protegendo o pátio interno.
No Palácio do Governador o programa é mais simples permitindo maior liberdade plástica. Isso explica os grandes vãos adotados, a viga virandeil que sustenta todos os andares, dando ao palácio um aspecto inventivo e inesperado, como se feito para o mundo de amanhã.
Seus pilotis de oito metros de altura lhe conferem a escala que um prédio desse gênero requer e o conjunto de rampas e esculturas, pelo contraste, a grandeza arquitetural procurada.
Interiormente o palácio compreende um enorme salão, livre de colunas, apto a todas as modificações possíveis: íntimo ou espetacular conforme os espaços para esse fim organizados. 
Externamente é o palácio suspenso sobre o espelho d'água, lembrando, como disse uma jornalista italiana sobre o auditório de Constantine: "Uma astronave que ali tivesse pousado de repente!" *1
 
 
*1 NIEMEYER, Oscar. Centro Administrativo de Pernambuco. Rio 11.3.80. Fundação Oscar Niemeyer. Coleção Oscar Niemeyer.